É sabido, e aceito, pelo establishment empresarial internacional, especificamente empreiteiras que executam obras em áreas gravadas como de alto risco local, que há um percentual no BDI (Boletim de Despesas Indiretas) das obras, que é usado para pagar pedágio a quem domina a área.
Isso ocorre amiúde em obras nos países da África subsaariana, onde áreas dominadas por tribos autônomas só recebem obras ou serviços de infraestrutura, ou socorro humanitário, se o órgão que for executar negociar com o chefe da tribo, geralmente um “rei”, um valor pecuniário.
Regra geral, mesmo pago esse valor, depois de concluída a obra, os equipamentos usados são arrestados pelo “rei”, que os vende depois em um mercado especializado nesse tipo de aquisição.
Tomei conhecimento dessa peculiaridade, há 10 anos, em conversa com um amigo que venceu uma licitação internacional para uma obra de saneamento, bancada pelo Banco Mundial, que tinha ubiquidade nas fronteiras de Angola, Namíbia, Zâmbia, Zimbábue e Botsuana.
Os cinco países deram autorização à empresa para entrarem nos seus respectivos territórios com os equipamentos, mas avisaram que negociações particulares deveriam ser feitas com as diversas tribos que dominavam territórios no espaço a sofrer a intervenções.
Por mera curiosidade, pois não tinha interesse comercial algum na empreitada, acompanhei-o em uma das incursões em Angola, na fronteira com a Namíbia, onde, além do pedágio, a empresa teve que deixar todo o maquinário usado na execução da obras.
Lembrei disso no momento em que li uma nota da revista Veja dessa semana, reportando que Marcelo Odebrecht, em um dos depoimentos à Procuradoria-Geral da República, relatou que a empreiteira Odebrecht pagou, desde os anos 1990 até 2010, às FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), um pedágio mensal que variava de US$ 50 mil a US$ 100 mil, para poder executar obras na Colômbia, em territórios dominados por elas.
Essa específica narrativa de Odebrecht, tecnicamente, no Brasil, não pode ser objeto de denúncia penal, mas serve para ilustrar que esse tipo de item é uma constante nos contratos com estas peculiaridades, e não deixa de ser uma vertente dos acordos que o Estado de Direito é obrigado a fazer com o estado paralelo se quiser trafegar por ele, à exemplo do que, amiúde, no Brasil, fazem as forças policiais com o crime organizado, quando os antagonismos se abespinham a ponto de sair do controle de ambos, os efeitos e consequências dos curtos circuitos.
É que a linha que separa ambos é muito tênue e, quando em vez, representantes das duas esferas, que vivem nas fronteiras, acabam tendo que atravessar para lá e para cá: são os viajantes dimensionais.
É por isso que sou leitor ( não confunda! Não sou eleitor. ) desse blog. "BDI" (Boletim de Despesas Indiretas), essa é nova. Sempre aprendo algo por aqui, é verdade que tenho a impressão que atualmente o ritmo está mais lento... Mas... é de graça...
ResponderExcluirNão seria "Bonificação de Despesas Indiretas" meu Lord?
ResponderExcluirO orçamento das despesas indiretas é tratado no Brasil, na verdade, com a titulação de "Benefícios e Despesas Indiretas" e como "Bonificação e Despesas Indiretas".
ExcluirEu discordo dos dois termos, pois tais acréscimos não são prêmios ao contratado, como sugerem as palavras empregadas, mas efetivos pagamentos de despesas havidas.
A rubrica surgiu na Inglaterra, com o nome "Budget Difference Income", que se traduz como o pagamento da diferença financeira entre o orçamento (Budget) técnico da obra e as despesas não civis referentes a sua execução. Para isso deveria ser apresentado um boletim detalhado ao contratante, que só fazia o pagamento no final.
Para manter a mesma sigla (BDI), o Brasil usou o termo já mencionado, mas, pelo histórico, e discordando da acepção de "Benefício ou Bonificação", prefiro o "Boletim", que é onde de fato se declaram as despesas indiretas.