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Como Zé Dirceu, o Brasil tem 221 mil presos provisórios que poderiam ser soltos

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Tenho lido críticas à decisão do STF que colocou em liberdade o ex-ministro José Dirceu. Nenhuma delas ataca a correção técnica da decisão e todas usam argumentos não jurídicos, que vão da mera vontade de que ele permaneça preso, até o clichê, não de todo incorreto, de que os poderosos conseguem a aplicação da lei a seu favor enquanto que o vulgo sequer chega ao STF para obter os mesmos benefícios.

Esse último argumento deveria ser usado ao contrário, ou seja, se Zé Dirceu foi posto em liberdade, conforme determina a lei, da mesma forma deveriam ser imediatamente beneficiados pela medida os 221 mil presos provisórios, em condições processuais parecidas, que cumprem verdadeiras penas antecipadas nas cadeias do Brasil.

Esta lógica serviria ao processo e aos presos provisórios que aguardam recursos ilegalmente presos, e não a de que como eles estão presos o Zé Dirceu também deve permanecer encarcerado, pois tal asserção não encontra estribo no devido processo legal e nem beneficia os hipossuficientes.

Mas eis que a paixão das horas não deixou com que a questão fosse adequadamente discutido, para que se cobre do Poder Judiciário a solução do problema que custa ao erário R$ 6,4 bilhões ao ano e custaria a terça parte disso se todos os 221 mil presos, nas mesmas condições processuais de Zé Dirceu, fossem libertados com um tornozeleira eletrônica como ele foi.

A pior situação, inclusive, no que toca aos presos provisórios, é que nesses 221 mil referidos, há uma quinta parte que nunca foi julgada e condenada: foram presos, quiçá na flagrância de algum delito, e esquecidos pelo sistema, o que constitui um flagrante desrespeito à Carta de Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário.

E, para finalizar, vem a pá de cal no nosso sistema penal: uma pesquisa do Ipea constatou que “37% dos presos provisórios são absolvidos dos crimes quando são julgados”, ou seja, em tese, a cultura do encarceramento no Brasil mantém, hoje, presas, 81,8 mil pessoas inocentes.

Comentários

  1. Parsifal, o teu raciocínio está perfeito. Deveria ser posto em prática, pelo menos a soltura imediata dos inocentes que não podem contratar advogados já que lhe foram retirados os direitos de cidadania.
    A conclusão é a lógica perversa que domina o nosso pais: quem tem bons e bem relacionados advogados ficam livres. E haja o anúncio de mutirões carcerários. Se já houve algum, os autos ainda estão sendo analisados.

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    1. É uma tragédia isso, meu caro Ronaldo. Ainda há aqueles condenados, já em execução de sentença, que já têm direito à progressão do regime e ainda continuam no regime de execução inicial, e, pior, aqueles que já cumpriram a pena, mas continuam presos.

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