Pular para o conteúdo principal

A crônica do cheque moradia anunciado

cheque

Por mais de uma vez escrevi sobre a exagerada distribuição de cheque moradia que o governo de Simão Jatene cometia durante o ano da sua campanha de reeleição.

O mero passeio pelos dados do programa continua sendo a prova irrefutável do seu uso eleitoral.

Até janeiro de 2014 o mês com maior desembolso do cheque moradia foi o próprio janeiro, com pagamentos que somaram R$ 9,2 milhões.

A partir dali o desembolso se avolumou até quase dobrar em agosto, passando para R$ 15,1 milhões, e dobrar em setembro, quando chegou a R$ 31 milhões, culminando o ano de 2014 com desembolso de R$ 145,2 milhões.

Diante da investida do MPF sobre o temerário uso do Cheque Moradia em ano eleitoral, Simão Jatene, já reeleito, continuou turbinando o programa em 2015, desta feita não mais como carenagem eleitoral, mas como uma espécie de álibi a posteriori.

O desembolso em 2015 foi de R$142,7 milhões, quantia praticamente similar a 2014. Agiu assim para sinalizar que o programa não fora turbinado no ano eleitoral.

Os engendradores do sofisma esqueceram de olhar para trás, já que o ponto comparativo, para os efeitos legais, deve obrigatoriamente ser com o ano anterior ao eleitoral, ou seja, 2013, quando o desembolso foi menos da metade de 2014. A artimanha não serviu para emendar o soneto.

Eu fiz pronunciamentos na Assembleia Legislativa denunciando o uso eleitoral do Cheque Moradia, ao que o governo retrucava que a ação era de natureza continuada, instituída em lei, não estando o governo obrigado a interromper o programa em ano eleitoral.

A réplica não encontrava estribo na legislação, que permite o uso e a continuidade dos programas sociais em ano eleitoral, mas também pune o abuso e veta desembolsos maiores do que aqueles aferidos no ano anterior à eleição.

O fato é que o governo preferiu apostar no “não vai dar em nada” a que toda a classe política estava acostumada na pátria amada, mas parece que o vício do cachimbo começou a entortar a boca.

O sexo explícito da campanha tucana com o Cheque Moradia foi o núcleo da ação protocolada pelo Ministério Público Federal, pedindo a cassação do registro de Jatene, na qual o Procurador Eleitoral afirmou que, durante a campanha, “aumentou o número de eventos promovidos e o número de processos abertos pelo programa, além da entrega de cheque moradia a eleitores que prometeram voto nos candidatos Simão Jatene e Zequinha Marinho”, opinando, por conseguinte, que Jatene se utilizou “do cargo público eletivo já ocupado” para exercer “influência nas eleições por meio do programa Cheque Moradia, com a finalidade de obter votos para a candidatura à reeleição, prejudicando a normalidade das eleições”.

No rumo dos três anos de governo, e sem mais chicanas a serem manejadas, o TRE-PA acolheu a exposição do MPF e cassou ontem (30), por 4 votos a 2, o mandato de Simão Jatene (PSDB) e de seu vice, Zequinha Marinho (PSC), proclamando assim que Simão Jatene praticou abuso de poder político e econômico na eleição de 2014.

Cabe recurso da decisão. Primeiro ao próprio TRE-PA, que dificilmente a modificará. Depois ao Tribunal Superior Eleitoral que tem pouca probabilidade de destituí-la, pois o procedimento probatório está robustamente imbricado nos autos.

Enquanto não transitar em julgado o acórdão do TRE-PA, Simão Jatene e Zequinha Marinho não deixarão os respectivos cargos de governador e vice, pois o recurso suspende os efeitos imediatos da cassação.

Todavia, por imposição da Lei da Ficha Limpa, a condenação sofrida por Jatene, por ter sido prolatada por um Tribunal, o torna inelegível por 8 anos, o que, a priori, o impede de registrar candidatura em 2018.

Não obstante, in casu, o princípio da inelegibilidade não é absoluto, podendo Simão Jatene pleitear, em sede de ação cautelar, que a inelegibilidade seja suspensa.

Politicamente, no entanto, a decisão do TRE-PA, para Simão Jatene, antes mesmo de lhe caírem os efeitos jurídicos, é um desastre político, já que a cassação repercutiu em todo o Brasil e o acórdão o torna um “ficha suja”.

O governo, a respeito da decisão do TRE-PA, publicou ontem (30) a nota abaixo:

Há um erro de informação na nota: a ação não foi movida pelo PMDB, mas pelo Ministério Público Federal, através da Procuradoria Eleitoral da República.

Comentários

  1. Para o governador,ministros, senadores, deputados, prefeitos e o escambau, a Lei. Ou se obedece à Lei, ou caminhamos para a barbárie. Acontece que mesmo devagar, as coisas estão mudando. Tempos atrás não se imaginava tantos políticos atrás das grades e já condenados, outros em vias de sê-lo. O problema é que esse vácuo de poder pode ensejar o aparecimento de um outro Messias, como aquelle - o duplo L é intencional mesmo - e descambarmos numa outra aventura. Mas ainda que haja esse risco, que se use a Lei para TODOS. A coisa chegou num grau de descaramento, que não há como estranhar que um cidadão comum se arvore ao direito de fazer bandalheira também. Para ele, a Lei igualmente. Simples, assim.

    ResponderExcluir
  2. Quanto custará aos jovens brasileiros este tecno-cinismo em que vivemos? Ou este mundo que não é mais o meu será deste jeito...e o que acontece não é a exceção?

    ResponderExcluir
  3. a vontade do povo e soberana.cada um que foi as urnas e exerceu de forma democratica o seu direito de escolha,e optou pla continuidade do governo que ai esta.tem que ser respeitado.2018 ta chegando e so aguardar.

    ResponderExcluir
  4. O pessoal que recebeu em 2015 foi para cumprimento das promessas feitas às vesperas do 2º turno, o que só vem comprovar a compra de votos que ocorreu descaradamente.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Comentários em CAIXA ALTA são convertidos para minúsculas. Há um filtro que glosa termos indevidos, substituindo-os por asteriscos.

Postagens mais visitadas deste blog

Mateus, primeiro os teus

Convalescendo da implantação de um stent , o governador Simão Jatene (PSDB-PA) foi apanhado, ainda no Hospital do Coração (SP), na manhã de ontem (03), por uma desagradável matéria da “Folha de S. Paulo” reportando que “ao menos sete familiares, além da ex-mulher e da ex-cunhada” de Jatene exercem cargos de confiança no Executivo, no Legislativo e no Judiciário do Pará. A reportagem declara que, somados, os salários dos familiares do governador “ultrapassam R$ 100 mil mensais”. > Sem incidência de nepotismo As averiguações já foram matérias em blogs locais. Quando me foi perguntado se feriam a Súmula 13 do STF (nepotismo), opinei que não, o que foi agora ratificado pela reportagem da “Folha” que, ouvindo “especialistas” declarou que os “casos não se enquadram diretamente na súmula vinculante do STF”. Nenhum dos parentes ou afins relacionados pela “Folha” está a cargo de órgãos vinculados ao executivo estadual e a matéria não demonstra a existência de cargos ocupados, no Poder...

O HIV em ação

A equipe do cientista russo Ivan Konstantinov arrebatou o primeiro lugar no “International Science and Engineering Visualization Challenge”, um concurso que premia imagens científicas da forma mais verossímeis e didáticas possíveis. Abaixo, a imagem em 3D do mortal vírus da Aids (HIV), em laranja, atacando uma célula do sistema imunológico, em cinza. A tática do HIV é se estabelecer dentro da célula, sem destruí-la. Na imagem abaixo foi feito um corte para mostrar o HIV já estabelecido no núcleo da célula imunológica, usando-a para se reproduzir, expelindo mais vírus que atacarão mais células imunológicas para torna-las hospedeiras, por isto o sistema imunológico do portador do HIV fica reduzido. As imagens foram retiradas do portal russo Visual Science .

Parsifal

Em uma noite de plenilúnio, às margens do Rio Tocantins, o lavrador pegou a lanterna e saiu correndo de casa à busca da parteira. Sua mãe, uma teúda mameluca, ficou vigiando a esposa que se contorcia com as dores do parto. Quando voltou com a parteira, o menino já chorava ao mundo. Não esperou: simplesmente nasceu. A parteira cortou o cordão umbilical e o jogou ao Rio Tocantins. Após os serviços de praxe de pós parto, a mãe de Ismael o chamou ao quarto para ver o filho. O lavrador entrou no quarto. A lamparina o deixou ver a criança ao peito da mãe: nascera Parsifal, pensou ele orgulhoso. O lavrador pegou uma cartucheira calibre vinte, carregou o cartucho ao cano, armou e saiu à porta. O Tocantins espreitava-lhe manteúdo. Apontou a mira da vinte à Lua e disparou: era assim que os caboclos do baixo Tocantins anunciavam a chegada de um homem à família.