Pular para o conteúdo principal

A Navalha de Ockham

Shot001

Desde a queda do King Air do Grupo Emiliano, na quinta-feira (19), têm surgido as mais absurdas teorias da conspiração, o que é normal nas circunstâncias, eis que a mente humana tende a preencher lacunas de acordo às conveniências, desprezando a indução dialética.

Conveniência não é evidência. Esse é o porquê da totalidade das teorias da conspiração jamais terem sido comprovadas. Investigam-se evidências a partir de fatos e eventos e não conveniências a partir de conclusões fantasiosas.

Esse princípio investigativo foi elaborado no século XIII, pelo frade franciscano William of Ockham, um proeminente filósofo, lógico e teólogo escolástico da Inglaterra. Foi ele quem elaborou o que ficou conhecido com a “Navalha de Ockham”, que em apertadíssima síntese determina que “entre duas hipóteses, aquela com menos suposições geralmente é a correta”.

A Navalha de Ockham, já comprovada estatisticamente, ensina que se você mora em uma casa com quintal e ouve um barulho à noite, o mais lógico é imaginar que se trata de um gato, um cachorro ou um ladrão, do que uma onça pintada que estava sendo levada para o zoológico em um veículo que capotou, a jaula quebrou, ela saiu, e foi virar o lixo no seu quintal.

A hipótese da onça é possível, mas a quantidade de eventos inextricavelmente ligados e necessários para que ocorra é muito numerosa para ser provável. E se você imaginar, a priori, essa hipótese, vai estar tentando vender a você mesmo a teoria da conspiração da onça pintada.

É conveniente que um ministro do STF morra? Na hipótese sim, para todo o pessoal envolvido nos processos sob sua relatoria, pois no mínimo ganhariam algum tempo. Mas é conveniente matar um ministro do STF? A lógica aponta que não, pois um evento do tipo chamaria mais atenção do que a Gisele Bündchen posando nua na Praça da República e para que o plano desse certo, sem deixar as mais tênues impressões, se faria necessária uma conspiração em nível elevadíssimo de precisão dos eventos articulados – até o mal tempo teria que entrar nessa equação.

Ainda, tal tipo de evento - como está ocorrendo - seria investigado exaustivamente e para apagar quaisquer evidências a aeronave vitimada teria que ser incinerada e o pó resultante enterrado com lixo atômico para ninguém ir chafurdar.

Portanto, a hipótese de menos eventos é a mais provável, antes porque mais de 50% dos desastres aéreos – e a estatística, calculada de forma séria, é uma ciência exata nos limites da sua margem de erro – se deram, conclusivamente, por “perda de controle em voo”, o jargão coloquial para o código LOC-I, sigla em inglês para  “Loss Of Control – Inflight”, o que vem a ser um eufemismo para “Erro Humano”, que corresponde à situação em que uma aeronave sai do seu envelope de voo (sustentabilidade), introduzindo na pilotagem um elemento de complicadíssimo comando, pois não é possível mudar as leis da física.

Comentários

  1. Parsifal;

    Convenhamos que o clima dá oxigênio para as teorias da conspiração. Um jato comercial se choca com outro, explode e cai de bico na amazonia e... a caixa preta sobrevive; o voo 147 da Air france despenca no meio do oceano atlântico e vai pro fundo de um abismo submarino, para ser resgatado um ano depois e... tchan... as caixas pretas funcionaram. Agora desde a hora em que o avião que levava o relator da 'lava-jato' caiu na flor d'água e sem explodir, que a globo já vem dando destaque no noticiário de que a caixa preta do king air pode estar danificada pela água do mar... mas nem examinaram direito?

    Aposto cem contra um que esse relatório da aeronáutica já está rabiscado desde o dia seguinte: vão dizer que a caixa preta estava totalmente danificada e a queda ocorreu por falha humana; e quanto àquela fumacinha que o pescador viu sair da asa... bem... cadê o pescador? Sumiu?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. A imprensa sempre faz um desserviço nessas horas, pois dá as informações com base em suposições e conveniências e, pior, não checa as informações com técnicos da área. Por exemplo, li uma ficha técnica do King Air na Folha de S. Paulo, que dizia que o King tem velocidade máxima de 750 km/h, o que é falso, pois esse tipo de aeronave tem alcance máximo de 482 km/h.
      O King Air, na verdade, não tem caixa preta. Tecnicamente e legalmente aeronaves não comerciais não estão obrigadas a terem. O que o King Air vitimado tinha era um gravador de voz local, equipamento que grava apenas o que o piloto conversa dentro da cabine ou com a torre de terra. Para ser chamado de caixa preta, o equipamento tem que cumprir uma série de requisitos, entre eles a capacidade de gravar voz local e remota e, principalmente e mais importante, os dados da navegação, pois são esses, mais que a voz, que fornecem os elementos fundamentais das investigações de sinistros.
      Mas já caiu por terra a convenciencia que serve à teoria da conspiração, de que a “Caixa Preta estava danificada”, pois já está oficializado que o gravador de voz está intacto e as falas estão recuperadas.
      O pescador que viu a fumaça não sumiu. Ele já prestou depoimento, mas a fumaça é mais uma conveniência apenas, pois a evidência é que toda a aeronave que se desloca, em tempo instável e úmido, com precipitação atmosférica, próximo à linha de água, principalmente salgada, condensa vapor que se esparge em seu entorno e isso, aos olhos do leigo, é fumaça.

      Excluir

Postar um comentário

Comentários em CAIXA ALTA são convertidos para minúsculas. Há um filtro que glosa termos indevidos, substituindo-os por asteriscos.

Postagens mais visitadas deste blog

Mateus, primeiro os teus

Convalescendo da implantação de um stent , o governador Simão Jatene (PSDB-PA) foi apanhado, ainda no Hospital do Coração (SP), na manhã de ontem (03), por uma desagradável matéria da “Folha de S. Paulo” reportando que “ao menos sete familiares, além da ex-mulher e da ex-cunhada” de Jatene exercem cargos de confiança no Executivo, no Legislativo e no Judiciário do Pará. A reportagem declara que, somados, os salários dos familiares do governador “ultrapassam R$ 100 mil mensais”. > Sem incidência de nepotismo As averiguações já foram matérias em blogs locais. Quando me foi perguntado se feriam a Súmula 13 do STF (nepotismo), opinei que não, o que foi agora ratificado pela reportagem da “Folha” que, ouvindo “especialistas” declarou que os “casos não se enquadram diretamente na súmula vinculante do STF”. Nenhum dos parentes ou afins relacionados pela “Folha” está a cargo de órgãos vinculados ao executivo estadual e a matéria não demonstra a existência de cargos ocupados, no Poder

O HIV em ação

A equipe do cientista russo Ivan Konstantinov arrebatou o primeiro lugar no “International Science and Engineering Visualization Challenge”, um concurso que premia imagens científicas da forma mais verossímeis e didáticas possíveis. Abaixo, a imagem em 3D do mortal vírus da Aids (HIV), em laranja, atacando uma célula do sistema imunológico, em cinza. A tática do HIV é se estabelecer dentro da célula, sem destruí-la. Na imagem abaixo foi feito um corte para mostrar o HIV já estabelecido no núcleo da célula imunológica, usando-a para se reproduzir, expelindo mais vírus que atacarão mais células imunológicas para torna-las hospedeiras, por isto o sistema imunológico do portador do HIV fica reduzido. As imagens foram retiradas do portal russo Visual Science .

Parsifal

Em uma noite de plenilúnio, às margens do Rio Tocantins, o lavrador pegou a lanterna e saiu correndo de casa à busca da parteira. Sua mãe, uma teúda mameluca, ficou vigiando a esposa que se contorcia com as dores do parto. Quando voltou com a parteira, o menino já chorava ao mundo. Não esperou: simplesmente nasceu. A parteira cortou o cordão umbilical e o jogou ao Rio Tocantins. Após os serviços de praxe de pós parto, a mãe de Ismael o chamou ao quarto para ver o filho. O lavrador entrou no quarto. A lamparina o deixou ver a criança ao peito da mãe: nascera Parsifal, pensou ele orgulhoso. O lavrador pegou uma cartucheira calibre vinte, carregou o cartucho ao cano, armou e saiu à porta. O Tocantins espreitava-lhe manteúdo. Apontou a mira da vinte à Lua e disparou: era assim que os caboclos do baixo Tocantins anunciavam a chegada de um homem à família.