Pular para o conteúdo principal

Os bêbados e os desequilibrados

Shot006

O ministro do STF, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Gilmar Mendes, decidiu vergastar, ontem (17), os fazedores de leis, ao opinar, durante sessão de redação da Corte, que a lei da Ficha Limpa é tão mal feita que parece "que foi feita por bêbados”.

Sempre digo que o Brasil tem a cultura da “legislorreia”, mistura de legislação com diarreia: os parlamentares fazer leis para tudo, porque a imprensa e a população, equivocadamente, lhes medem a produtividade pelo número de projetos apresentados, não importando do que tratam, tão pouco a qualidade das letras. Assim as leis vão saindo, 80% delas imprestáveis, ou por inconstitucionalidade ou por inutilidade no mundo jurídico.

A técnica legislativa, idem, é sofrível na mesma proporção ao norte aquilatada, eis porque a maioria dos parlamentares prefere contratar cabos eleitorais do que técnicos para os seus gabinetes. Isso vale para mim também.

Portanto, o ministro Gilmar Mendes, conceitualmente, está correto, mas tecnicamente, no específico estribo no qual enfiou o pé para subir na sela, cai do cavalo, pois os arreios foram mal apertados. Ao final, do ponto de vista protocolar, Mendes jamais poderia usar da expressão em relação a um outro poder da República, pois isso é, idem, coisa de bêbado.

Explico o falso fundamento de Mendes: ele afirmou que a lei da Ficha Limpa foi mal redigida usando como exemplo o fato específico em redação, de que ela escreve que “serão inelegíveis os candidatos que tiverem suas contas rejeitadas”, mas a redação, observa ele, “não especifica a que tipo de contas se refere, se as de gestão ou as de governo”.

O mais elementar princípio de intepretação jurídica determina que quando o legislador não especifica não cabe ao julgador especificar. Portanto, quando a lei se refere apenas ao gênero, obriga em seu conteúdo tudo o que nele está contido.

No gênero felino, por exemplo, estão várias espécies, como o gato, a onça, o leão. Portanto, quando o zoológico coloca uma placa de que você está entrando na área de felinos, encontrar-se-ão lá as espécies respetivas.

O gênero “contas” do poder executivo municipal contém duas espécies: as contas de gestão e as contas de governo. Se a lei se refere a “contas” e não desce às espécies, o julgador está obrigado a aplicar o entendimento de que as duas espécies estão alcançadas, e foi exatamente com base nesse princípio que o STF acordou que tanto as contas de gestão quanto as de governo dos prefeitos municipais só podem ser julgadas pelas Câmaras Municipais, emitindo os tribunais de contas apenas pareceres sobre elas.

A redação da lei da Ficha Limpa, portanto, neste paço específico, está absolutamente correta e bem redigida, ou seja, pelo menos nesse ponto, o legislador estava sóbrio quando a aprovou e o ministro Gilmar Mendes desequilibrado quando o criticou.

Comentários

  1. Será que o Eder Mauro e o Zenaldo não querem me vender os bens deles pelos valores que estão informando à Justica Eleitoral? Parece promocao das Casas Bahia, tudo abaixo do preço.

    ResponderExcluir
  2. Caro Parsifal. Como político experiente e advogado, ouso fazer uma sugestão no sentido de o Blog abrir um link sobre o que pode e especialmente o que não a essa altura da corrida eleitoral, inclusive com a possibilidade de consultas sobre a legislação. Moramos numa região onde o improviso, a temeridade e mesmo a má fé permeiam as campanhas eleitorais, ainda que esta de agora tenha a tendência de ser extremamente judicializada. Seria uma contribuição interessante do Blog para a sociedade.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Comentários em CAIXA ALTA são convertidos para minúsculas. Há um filtro que glosa termos indevidos, substituindo-os por asteriscos.

Postagens mais visitadas deste blog

Mateus, primeiro os teus

Convalescendo da implantação de um stent , o governador Simão Jatene (PSDB-PA) foi apanhado, ainda no Hospital do Coração (SP), na manhã de ontem (03), por uma desagradável matéria da “Folha de S. Paulo” reportando que “ao menos sete familiares, além da ex-mulher e da ex-cunhada” de Jatene exercem cargos de confiança no Executivo, no Legislativo e no Judiciário do Pará. A reportagem declara que, somados, os salários dos familiares do governador “ultrapassam R$ 100 mil mensais”. > Sem incidência de nepotismo As averiguações já foram matérias em blogs locais. Quando me foi perguntado se feriam a Súmula 13 do STF (nepotismo), opinei que não, o que foi agora ratificado pela reportagem da “Folha” que, ouvindo “especialistas” declarou que os “casos não se enquadram diretamente na súmula vinculante do STF”. Nenhum dos parentes ou afins relacionados pela “Folha” está a cargo de órgãos vinculados ao executivo estadual e a matéria não demonstra a existência de cargos ocupados, no Poder...

Parsifal

Em uma noite de plenilúnio, às margens do Rio Tocantins, o lavrador pegou a lanterna e saiu correndo de casa à busca da parteira. Sua mãe, uma teúda mameluca, ficou vigiando a esposa que se contorcia com as dores do parto. Quando voltou com a parteira, o menino já chorava ao mundo. Não esperou: simplesmente nasceu. A parteira cortou o cordão umbilical e o jogou ao Rio Tocantins. Após os serviços de praxe de pós parto, a mãe de Ismael o chamou ao quarto para ver o filho. O lavrador entrou no quarto. A lamparina o deixou ver a criança ao peito da mãe: nascera Parsifal, pensou ele orgulhoso. O lavrador pegou uma cartucheira calibre vinte, carregou o cartucho ao cano, armou e saiu à porta. O Tocantins espreitava-lhe manteúdo. Apontou a mira da vinte à Lua e disparou: era assim que os caboclos do baixo Tocantins anunciavam a chegada de um homem à família.

Campanha para nomeação de Defensores Públicos aprovados em concurso

Os aprovados no concurso da Defensoria Pública do Pará, em 2009, labutam pela nomeação e, às vésperas da expiração do prazo do concurso, 23.07.2011, iniciam uma campanha para não terem as suas expectativas frustradas. No concurso de 2009 foram aprovados 148 candidatos, dos quais 56 foram nomeados e 92 aguardam nomeação. Por emenda da deputada Simone Morgado, o Orçamento do Estado, para 2011, prevê dotação para a contratação de 45 Defensores Públicos. A Defensoria Pública do Pará está recebendo, desde janeiro deste ano, os repasses financeiros já acrescido o valor da emenda citada, mas, até o momento não notificou os aprovados para nomeação, assim como não dá explicação alguma da não providência. Dos 144 municípios do Pará, 83 não possuem Defensores Públicos. Das 117 comarcas instaladas no Pará, em apenas 65 há Defensores Públicos lotados. O Grupo de Concursados requer a nomeação dos 45 Defensores Públicos para os quais o órgão possui dotação orçamentária e recursos financeiros para c...