Por incrível e cáustico que possa parecer, o melhor e mais consistente discurso na longa sessão do Senado que apreciou a admissibilidade do impeachment da presidente Dilma Rousseff, foi o de outro presidente da República impedido, o atual senador Collor de Mello, talvez por conhecimento de causa:
1. Os dois pesos da história
"Em 1992 bastaram menos de quatro meses entre a denúncia e a decisão de renunciar. No atual, já foram oito meses, e podem ser mais seis até o final. O rito é o mesmo, o rigor, não. O parecer que hoje discutimos possui 128 páginas, o mesmo parecer de 1992 continha meia página, com apenas dois parágrafos. Em 1992 fui instado a renunciar, na suposição de que as acusações fossem verdadeiras. Me utilizei de advogados particulares, dois anos depois fui absolvido de todas as acusações no Supremo Tribunal Federal".
2. Elle bem que avisou...
"Constatamos que o maior crime de responsabilidade está na irresponsabilidade pelo desleixo com a política, pelo desleixo com a economia de um país, no aparelhamento do estado que o torna inchado. Nas obstruções de ações da Justiça. Não foi por falta de aviso. Falei dos erros da economia, da excessiva intervenção estatal, da falta de diálogo com o parlamento. Nas minhas poucas oportunidades com a presidente, sugeri uma reconciliação do seu governo com a classe política. Alertei sobre a possibilidade de impeachment".
3. Críticas à lei do impeachment
"Não existe fórmula mágica dentro do nosso presidencialismo. Ainda mais com uma lei nos moldes da 1079, a ressurrecta, que dá margem às permanentes ameaças a qualquer governo”.
4. Críticas ao sistema presidencialista
"O todo dessa obra em ruína tem também um pano de fundo invisível: o sistema presidencialista. São 127 anos de crises e insurreições. Convivemos com revoluções, enfrentamos ditaduras civis e militares. De 1926 até 2011, nenhum presidente transmitiu o cargo ao sucessor pelas mesmas regras do antecessor. Não podemos mais rechear nossa história com deposições, suicídios e impedimentos. Não há como recuperar esse modelo de coalizão, cooptação e fisiologismo que envergonham a classe política".
O discurso de Collor de Mello foi o único que chamou a atenção da Casa: todos os presentes silenciaram para ouvi-lo.
Pois é... Eis que Collor usou bem a oportunidade que os ventos lhe trouxeram à fraldas. E como disse o autor e poeta estadunidense Henry Thoreau, “os homens hão de aprender que a política não é a moral e que se ocupa apenas do que é oportuno”.
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