Que santo é este?

A Lava Jato, que debalde tem gritado ao Procurador-Geral da República o nome do senador Aécio Neves (PSDB-MG), vendo que o ouvido é mouco no rumo das Minas Gerais, resolveu mudar a direção dos ecos para São Paulo.

Dentre as anotações apreendidas ao executivo da Odebrecht, Benedicto Barbosa, há uma que sugere cartel e pagamento de propina em obra do governo de São Paulo, em 2002, quando o governador era, como agora, Geraldo Alckmin (PSDB), que, por ser tucano, passa ao largo do famoso “Propinoduto Tucano”, tão grande quanto o da Petrobras, nos metrôs de São Paulo.

Deus e o diabo sabem que as grandes empreiteiras têm uma carteira de processos licitatórios, onde estocam obras de quem “vence” e de quem “cobre”, para futuras compensações.

O algoritmo é bem elaborado: quem “vence” a licitação fica com o maior percentual dela, na proporção do que “abriu” para outras antes, e o valor restante é dividido pelas “perdedoras” na proporção dos créditos que têm na bolsa de compensações, estabelecendo-se assim o cartel, pois isso leva ao controle dos preços das obras públicas, frustrando a concorrência e fraudando a lei das licitações.

O manuscrito de Benedicto Barbosa chama isso de "acomodação de mercado" e a anotação refere-se à duplicação da rodovia Mogi-Dutra, que foi “vencida” pela Construtora Queiroz Galvão.

Ainda na mesma planilha, está dito que sobre o valor da obra, que era, em 2002, de R$ 68,7 milhões, cerca de R$ 200 milhões hoje, dever-se-ia acrescer 5% correspondente ao "santo", o que se referia, segundo o tradutor da PF, a pagamento de propina.

A primeira alcunha correspondente a quem os 5% deveriam ser pagos era “apóstolo", que depois foi riscada e substituída por "santo", o que abre o leque de apostas, pois os apóstolos foram apenas 12 e santos a Igreja Católica tem um para cada dia do ano.

Ao verificar o procedimento da licitação, os procuradores verificaram que elas seguiram o mesmo padrão de variações mínimas entre as propostas: a diferença entre o valor apresentado pela Andrade Gutierrez (2º lugar), pela OAS (2ª) e pela Odebrecht (5ª) foi, respectivamente, de 0,6 e 2,5 pontos percentuais. O mesmo padrão seguido pelas licitações na Petrobras.

No manuscrito de Benedicto Barbosa também vem o robusto indício do cartel, anotando que, na "acomodação de mercado", à Odebrecht caberia 19% do valor do contrato e, em correspondência, a empresa pagaria ao “santo” R$ 687 mil, na proporção das parcelas recebidas, sendo que a primeira parcela, uma espécie de entrada, seria paga no momento da homologação.

O enigma desta anotação, que quebra a cabeça dos procuradores e delgados, não é provar o cartel e as propinas, pois isso está claramente escrito, mas saber que santo é este, e pelo jeito, só um milagre desvenda o enigma.