Projeto de lei que concede anistia às praças padece de inconstitucionalidade formal

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O governador Simão Jatene cometeu crasso equívoco ao bancar a aprovação da lei que instituiu a política salarial dos oficiais da PM e Bombeiros, apartada das praças.

Para colocar fim a um aquartelamento de 8 dias, prometeu-se às praças a aprovação de uma lei que anistiasse os insurgidos das infrações administrativas.

> Matéria privativa do governador

Para minha surpresa o devido projeto de lei foi originado na Alepa. Confeccionado pelo presidente da Comissão de Constituição e Justiça, deputado Raimundo Santos (PEN) e assinado por 29 deputados, o projeto é formalmente inconstitucional.

A matéria, por incidir no regime jurídico da PM e Bombeiros – que são servidores do Estado – é de privativa iniciativa do governador do Estado. Tal exclusividade estriba-se no artigo 61, § 1º, inciso II, alíneas c e f da Constituição Federal, que por força do princípio da simetria de competência federativa, se rebate no artigo 105, inciso II, alínea b da Constituição Estadual.

O STF guarda inúmeros acórdãos declarando, em casos análogos, a inconstitucionalidade de leis parecidas.

> Julgado

Para não entediar – isso não é uma peça jurídica – abaixo está um dos mais de cem acórdãos referentes, esse na ADI 2966, cujo relator foi o ministro Joaquim Barbosa:

“Ação Direta de Inconstitucionalidade, Militares, Regime Jurídico. Iniciativa Privativa do Chefe do Poder Executivo. Procedência do Pedido. Emenda Constitucional 29/2002 do estado de Rondônia. Inconstitucionalidade. À luz do princípio da simetria, é de iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo estadual as leis que disciplinem o regime jurídico dos militares (art. 61, § 1º, II, f, da CF/1988). Matéria restrita à iniciativa do Poder Executivo não pode ser regulada por emenda constitucional de origem paramentar. Precedentes. Pedido julgado procedente.”

Observe que mesmo uma emenda constitucional não é instrumento legislativo para elidir a invasão da exclusividade constitucional do Poder Executivo na matéria, o que se dizer, então, de uma lei ordinária: sem chances.

> Caso de Alagoas

O caso similar mais recente (ADI 4928) em apreciação no STF é de iniciativa do Estado de Alagoas, onde o governador Teotônio Vilela (PSDB) reclama a inconstitucionalidade de lei de iniciativa parlamentar (Lei n° 7.428/12) que concedeu anistia administrativa a militares que se aquartelaram. O governador vetou a lei, pois não concorda com a anistia, e a Assembleia de Alagoas derrubou o veto, o que causou a insurgência do governador contra o diploma.

O ministro Marco Aurélio Mello, relator da ADI, ouviu a Advocacia Geral da União e essa, valendo-se do já mencionado artigo da Carta Federal e da sobeja jurisprudência do STF, opinou pela procedência do pedido.

> Perguntas dos desconfiados

Da luminar inconstitucionalidade do projeto de anistia administrativa em tela, surgem alguns questionamentos:

1. Por que o presidente da Alepa não requereu ao governador Simão Jatene que enviasse o projeto?

2. Por que o próprio governador, para cumprir o compromisso feito pelo presidente da Alepa, não erigiu o projeto de sua privativa competência?

3. O governador, que não tem poder discricionário para sancionar leis solidamente inconstitucionais, vai sancionar o projeto a ser aprovado na Alepa e inserir no mundo jurídico uma lei formalmente inconstitucional, que poderá assim ser declarada através de ADI?

Como o seguro morreu de velho e o desconfiado ficou para o velório, esses questionamentos devem ser feitos pelos que serão beneficiados pela anistia, pois receberão um unicórnio jurídico.

A outra alternativa é cruzar os dedos para que a inconstitucionalidade não seja  arguida no STF – na Alepa não será, e se fosse seria esquecida, pois a Casa trata essas questões com relativismo - ou, em sendo, quando declarada já alcançar as infrações administrativas eivadas pela prescrição.

É a nossa mania de, por razões escuramente claras, querer escrever o certo por linhas tortas.

Comentários

  1. Politicagem e só.

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  2. Parsifal, essa novela é um enredo de inconstitucionalidades. O projeto do Jatene era inconstitucional, a tua emenda era inconstitucional (eu sei, tu já disseste que colocaste apenas o bode na sala) e o projeto de anistia é inconstitucional. O Jatene vai sancionar, o que também é inconstitucional, pois a sanção dele não torna essa droga receitável e se a Alepa fosse composta por parlamentares sérios (desculpas, nada pessoal) a sanção seria tida como crime de responsabilidade.
    Mas vai tudo ficar por isso mesmo, pois somos o país da irresponsabilidade jurídica.
    Sabes qual a maior reserva de quem resiste em investir no Brasil? Claro que sabes. Não é a violência e nem a anemia econômica: é a insegurança jurídica.
    Fui teu professor de Direito Constitucional e já eras brilhante como aluno. Pena que abandonaste a ciência. A academia perdeu um ótimo cérebro e Pará ganhou apenas um político a mais.
    Desculpa de novo.

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    1. Meu caro professor, obrigado pelo elogio e pela reprimenda.

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  3. parsifal eu espero que vc e todos os deputados que ficaram ao lado da tropa e querem a melhoria salarial, melhoria das condições de serviço, melhoria dos quarteis, melhoria das condições de moradia do policial militar, após a sua vitoria e do helder barbalho para o governo do estado, não nos esqueçam e nos dê às costas, pois o mundo é redondo e ele dá volta....estamos confiando em vcs, dando nossa cara a tapa e colocando nosso emprego e até mesmo a liberdade em jogo...empurrado por vcs para essa cova, só esperamos não ser novamente enganados, pois possuimos imagens e gravações de promessas e criticas severas feitas por vcs e seus orgãos de imprensa...nos dando apoio e criticando as ações do atual governo....estamos dando esse voto de confiança à vcs em 2014

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    1. E ainda tem gente que acredita em Papai Noel...meu Deus...te prepara pra correr atrás de emprego, combatente...kkkkk

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  4. Ser ou não inconstitucional, tanto faz. A verdade é que essa anistia é uma vergonha e uma desilusão para quem quer que o Pará tome jeito. Policiais fazem greve, fecham ruas, pontam o sete e está tudo bem, pois depois vem uma anistiasinha. Será que a Alepa poderia votar uma lei para anistiar a minha dívida no cartão?

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    1. pode sim te colocando na cadeia
      pois quem fala mal de policia é bandido

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    2. a tua raiva é a vontade de roubar sem ser perseguido pela policia
      e um a melhor remunerada vai acabar te colocando no xadres

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    3. fica cristalino que esse anonimo e mau carater, querer uma anistia para não pagar cartão e confesar que pratica no seu cotidiano o art.171 CPP , meu amigo vai estudar pra ganhar mais é pagar as suas contas seu mal carater !!!!

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  5. Deputado, eu concordo plenamente com o teu professor.

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  6. Tem pessoas que carregam o fardo missionário...fardo para quem o vê sendo carregado...para quem o carrega não é um fardo...é uma Missão!

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  7. Era notório pelas palavras de algumas autoridades que essa "insurgência" não sairia barato caro amigo. Veremos notícias do próximo capítulo...

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  8. Parsifal;

    Discordo da expressão "crasso equívoco" empregada por você para avaliar a decisão do governador Simão Jatene. Um dia, em ambiente de total descontração, fiz uma pergunta simples a ele e como resposta obtive uma explicação de que não sabia 'absolutamente nada' sobre o assunto - o que tomei como um basta para qualquer outra pergunta, mesmo que não fosse tola ou inconveniente como não foi a que lhe havia feito.

    A soberba (que o ser humano cultiva) não o permite divergir de si mesmo em relação ao modo como vem tratando os servidores públicos desde o seu primeiro dia de 'excelentíssimo', colocado nesta condição por uma das campanhas mais impressionantes pelo abuso da máquina governamental e do dinheiro (público e/ou promiscuamente relacionado ao setor privado) a favor de um 'patrício' apoiado por Almir Gabriel, cuja imagem de 'competente técnico' havia cunhado na mídia como uma moeda falsa.

    Existe muita correspondência entre uma lei 'feita em erro' com um governador 'feito em erro'.

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