O vento como herança

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A arte da governabilidade refere-se ao equilíbrio entre os poderes. Se um deles definha ou viceja mais que outro, o diagnóstico compromete a República. A crise que se enxerga é consequência do gigantismo padrão do Poder Executivo, que de tão espaçoso acabou pisando nos próprios pés.

Avoluma, todavia, a crise, a súbita inversão de sentido do presidencialismo de coalizão, feito que um dos braços do Poder Legislativo, a Câmara Federal, aproveitando-se de um manejo mal enjambrado do governo, instalou no Brasil uma espécie de parlamentarismo com filariose que, à guisa de exercer com independência o seu múnus, exagera a ponto de infeccionar a República.

O Senado Federal, institucionalizado no presidencialismo para ser o centro de gravidade da República, tem a obrigação de devolver o pêndulo ao ponto de equilíbrio, para prevenir a queda da casa, pois, como escrito por Salomão, “todo aquele que destrói a própria casa tem o vento como herança”.

Casas não deveriam ruir. E mesmo em se constatando a necessidade de destitui-las do quarteirão, aconselha-se desmontá-las com zelo, pois a madeira da demolição tem uso.

Nessa linha, o presidente do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB-AL), ouvindo seus pares, decidiu, ontem (10), acordar com o governo a engenharia do dique, para segurar, no Senado, a “pauta bomba” despejada por uma Câmara – salvo o bom senso que ainda more por lá - alucinada.

Todavia, não enxerguei segurança na barragem que Calheiros e o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, planejaram enfincar na rampa do Planalto, já denominada de “Agenda Brasil”.

Segundo a imprensa noticiou ontem (10), a “Agenda Brasil” teria 28 pontos, dos quais seis seriam os mais importantes:

1. Regulamentar trabalhadores terceirizados
2. Revisar marcos jurídicos de áreas indígenas
3. Acelerar a liberação de licenças ambientais
4. Cobrar dos mais ricos pelo uso do SUS
5. Ampliar a idade mínima para aposentadoria
6. Vender terrenos da Marinha e prédio militares

Ficou acertado que o ministro Levy teria até as 16h de amanhã (12) para obter do Planalto os temas considerados “mais prioritários e politicamente viáveis”.

Os seis pontos listados são prioritários e importantes, mas nenhum deles é, na atual conjuntura, politicamente viável, antes porque, dispensadas quaisquer discussões de mérito, o Senado não pode deliberar sobre eles sozinho e todos precisam ser apreciados pela Câmara Federal.

Resta ao Senado, portanto, agir do modo que ele foi constituído para ser: aquele que coloca o pêndulo no centro de gravidade da República, sem se expor em uma agenda que não terá consequência prática no tempo urgente que a República requer.

Resta ao governo, nesse ínterim, pois o Senado tem tutano limitado para segurar as anomalias da Câmara, tomar tento e recompor a sua base, pois desistir desse exercício é desistir do governo.

Comentários

  1. este comentario está muito bem escrito.
    Na minha opinião, muito mais proveitosa do que essa agenda seria uma decisão seria de que os subalternos (incluindo o dnit) tem que trabalhar (não afirmo que isto seja facil).
    Precisamos de "motores" para a economia. A infraestrutura poderia ser o mais importante deles. Faltam ferrovias, faltam rodovias. Para iniciar novas ferrovias e rodovias, é preciso muito trabalho, desapropriações, licitações, mesmo um governo que mereça tal nome demoraria muito para fazer. Duplicação e alargamento de estradas existentes é mais facil, e deveria ser feito a partir de AMANHÃ.

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  2. Ou seja, vamos trabalhar para pagar o que o governo Dilma deve aos bancos. Beleza pura!
    Parsifal, o que caiu, quebrou, não se conserta mais. O governo Dilma acabou antes de começar.

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