Ninguém conhece verdadeiramente uma nação até que tenha estado dentro de suas prisões

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Embora assuste e indigne, o Pará não tem o pior sistema prisional do Brasil. Se manter prisões que atentem contra a dignidade for motivo de prisão para governadores, os 26, e mais o do DF, deveriam estar presos.

O depoimento de Maira Fernandes, conselheira da OAB do Rio de Janeiro e membro da Comissão Nacional do Sistema Carcerário, que visitou, juntamente com Adilson Rocha, os cárceres paraenses, é menos afetado:

"Voltando ao Rio, às 5h da matina, relembro o que vi nos presídios de Belém e a frase de Mandela: "ninguém conhece verdadeiramente uma nação até que tenha estado dentro de suas prisões".

Conheço tanto esta cidade, que para mim cheira a perfume Phebo, temperos e ervas do Ver-o-Peso, chuva na terra molhada ou manga fresca. Lembranças sensoriais da infância, incompatíveis com o que vi e senti lá dentro do cárcere.

Toda unidade prisional tem odor característico, mas na primeira que visitamos ele era terrivelmente acentuado e misturado com cheiro de queimado. Dizem os presos que queimam um pouco de espuma e deixam sempre uma fumacinha saindo para afastar mosquito. Os agentes dizem que eles os queimam para jogar numa placa de segurança que é resistente a bala, mas não a fogo, na tentativa de derrubá-la. Fica difícil respirar lá dentro. Há ratos, muitos ratos, e eu vi um! A fotógrafa quase conseguiu registrar, mas ele correu e se embrenhou numa montanha de lixo (!).

Os problemas de sempre - presos além do tempo, revista vexatória nas visitantes (inclusive idosas!), ausência de médicos e medicamentos, água potável, colchões, higiene - misturam-se a especificidades daqui: a segurança é feita por contratados (um cabide de empregos, dizem) e não por agentes penitenciários concursados; ainda há presos em delegacias e, o que mais me estarreceu...HÁ PRESOS EM CONTAINERS!!! Socorro! O STJ já proibiu o uso desses malditos containers! Isso é para depósito de coisa, não de gente!

As inspeções tomaram toda a manhã e, à tarde, estipulamos as medidas que iremos tomar: relatórios, mil ofícios, ações civis públicas, pedido de mutirão ao CNJ. Não sei se isso vai adiantar, mas ao menos quem leu esse post é testemunha de que estamos nos esforçando para fazer a nossa parte...não dá para cruzar os braços, nem esquecer o que vi aqui, justo na terra de meu pai".

Não é possível ler o Brasil como um país civilizado se as letras que temos dele é a desumanidade dos nossos cárceres. Torná-los dignos é o paradoxo da nossa encruzilhada, pois o cidadão cá fora reclama que muitos homens livres não têm o que queremos oferecer aos que se fizeram presos. 

O remédio não é construir mais prisões, mas espalhar escolas por cada esquina, pois como disse Victor Hugo, “quem abre uma escola fecha uma prisão”, ao que completo que só a educação liberta.

Comentários

  1. Qual o apoio federal para os sistemas penitenciarios? O maior bolo da arrecadação cresce cada vez mais na mão do poder central.

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  2. Afonso Arinos05/06/2014, 11:20

    muitos defendem que as condições sub humanas de nossos presídios seriam complemento da pena por seus crimes. É um equívoco. O estado de civilidade que permite e garante nossa liberdade está fundado no respeito às leis, inclusive de quem às descumprem. Nem sempre quem cumpre pena é mau ou criminoso contumaz, muitos são criminosos circunstanciais, que sucumbiram por inconsequência, ou desespero ante às dificuldades impostas ao longo da vida. Situações corriqueiras que podem acontecer com qualquer um, inclusive com pessoas próximas. será que muitos não teriam direito de serem tratados de forma digna para que após cumprirem sua pena pudessem retomar suas vidas? As condições de nossa prisões negam peremptoriamente, os princípios constitucionais que resguardam a todos nós. Negar ao presidiários seus direitos humanos é de forma indireta, negar também os nossos. O desprestígio à Constituição alimenta a corrupção, a violência, a desigualdade e a ineficiência do Estado.

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    1. ao colega Afonso Arinos a minha nota dez por suas declarações pontuadas e centrada de uma mente sã, te parabenizo e faço da tuas palavras e indignações as minhas. hoje defendo a educação no sistema prisional como alternativa de ressocialização, porém se essa educação dada não seja só formalidade pra aparecer e querer ganhar títulos, o importante é que seja árduo o projeto, porém com respostas dignas pra ganhar o apenado, a sociedade e a família dessa vítima que muitas vezes são cobaias de arrecadações milionária para a classe burguesa

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    2. parabéns pelo comentário de Afonso Arinos

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  3. o problema é que: "quem abre uma escola perde 1000 votos!" frase minha mesmo.

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  4. Eu sou da opinião de que cadeia é para o cara pagar por seus pecados e não para estar em um Spa! Pq temos que ficar sustentando esses canalhas?
    Não quer passar por isso? Só não roubar, matar, furtar, traficar, sonegar e etc

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    1. Todos aqueles que delinquem devem ser punidos. A punição jurídica, todavia, não deve ser um castigo pelo mero fato que o homem é produto das suas circunstâncias e elas devem ser consideradas no momento da punibilidade.
      90% dos encarcerados ali estão por crimes eventuais, os quais cometeram não porque desejaram fazê-lo mas tangidos por um sistema que os levou a isso e esses apenados precisam, e vão, retornar ao convívio social. É da forma que os tratamos no cárcere, eles nos tratarão quando estiverem cá fora.

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    2. pensamento esquerdista detectado

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  5. O Dr. diz isso porque ainda não conhece os cárceres do Maranhão governado por PMDB-PT, parece que se aqui é o horror, em Pedrinhas é a sucursal do inferno. Se o Jatene tem que estar preso aqui, imagina o Clã dos Sarney no Maranhão, e a Dilma que a cada ano investe menos no Sistema Carcerário e na Segurança Pública. Se formos fazer a vontade do Doutor da OAB, a Dilma e os 27 Governadores vão experimentar o xilindró na parte de dentro das celas.

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  6. Na maquiagem do governo Jatene os presídios paraenses foram "humanizados" na atual gestão

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